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quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O "primo pobre" da Tropa de Elite...



Quando Tropa de Elite se tornou um fenômeno de vendas nos camelôs e fez sucesso no mundo dos downloads não se imaginava qual a dimensão que a produção poderia ganhar. Dirigido por José Padilha, levou ainda mais de dois milhões de pessoas aos cinemas e, de quebra, conquistou um Urso de Ouro em Berlim.
Embora repleto de cenas de violência, apontando o dedo em riste para a classe média como uma das principais culpadas pelo tráfico e pela violência da qual ela mesma havia se tornado vítima, seu discurso era sustentável e amparado por roteiro de qualidade e uma esmerada e digna de respeito.
Se há dois anos foi a vez do BOPE (a elite da polícia do Rio de Janeiro) ganhar as telas em 2008 , chegou a vez da ROTA (a elite da polícia de São Paulo) ganhar uma versão somente sua para o mundo audiovisual. Primo pobre, mas claramente inspirado no sucesso do seu antecessor, Rota Comando chega diretamente em DVD e, coincidência ou não, levou pouco menos de um mês para se tornar um campeão de vendas nos camelôs.
Baseado em livro do deputado estadual e ex-capitão da ROTA Conte Lopes – que também participa ativamente no filme – a produção está longe da qualidade de Tropa de Elite, em todo e qualquer aspecto que venhamos a fazer comparações. Nos primeiros minutos de Rota Comando temos a impressão de estar vendo não um filme, mas um vídeo institucional, tamanha é a parcimônia e a maneira didática com que o grupo Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar é apresentado.
Tudo colabora para essa impressão. A começar pela fotografia que, ao procurar se aproximar do dia a dia da corporação e adotar um tom mais documental faz por parecer a câmera de reportagem de um programa policial, inquieta e sempre pronta para desviar o foco das atenções ainda que a imagem seja a prejudicada. O tom “realista” parece ser proposital, já que algumas tomadas e planos se aproximam muito de imagens que estamos a costumados a ver no noticiário.
Se a corporação é apresentada em todas as suas minúcias – o que nitidamente é desnecessário caso o propósito seja fazer uma obra de ficção – ao saírem as primeiras viaturas para a rua o que se vê é uma ROTA com uma conduta exemplar, imaculada. Para se ter uma idéia, durante todo o filme, apenas um policial comete uma falha (constrange um cidadão inocente numa abordagem graças a um erro ao anotar o número da placa de um carro) e esta é punida imediatamente (com ele sendo constrangido diante da corporação).
Não estou com isso dizendo que a ROTA é corrupta ou algo do gênero, pelo contrário. Não conheço o trabalho do grupo , mas não tenho dúvidas da idoneidade da maior parte dos seus integrantes. Mas daí a pintar um quadro de uma corporação perfeita, a coisa muda de figura. E, se a fotografia do filme faz lembrar os episódios televisivos do antigo seriado Pista Dupla (que passou na CNT na década de 90), outros dois truques baratos fazem com que a produção beire o constrangedor.
O primeiro deles é a edição. Repare que a cada mudança de cena com ação ou cada nova missão cumprida efetuada pelo grupo uma música de fundo entra com a função de “criar o clima” apropriado para a cena. É como se não houvesse confiança de que a própria sequência em si seja capaz de sustentar o mesmo efeito sozinha. E de fato, na maioria dos casos, não é.
Já o segundo é um erro – mais grave e com propósito certeiro – é a contraposição de situações apresentadas pelo roteiro. Repare como os atores que interpretam os bandidos se expressam com gestos tão excessivos para compor o estereótipo dos malvados que acabam se tornando caricatos e inverossímeis. Por outro lado, os policiais da ROTA, em momento algum perdem o controle, dentro ou fora da ação, o que faz com que a idealização dos combatentes chegue a níveis máximos.
Para minimizar esse quadro, a história contrapõe sempre a ação dos policiais com a ação dos bandidos em pequenos furtos, agressão a pessoas inocentes, seqüestros e outras violências envolvendo a classe média. É óbvio para qualquer cidadão de bem é chocante ver um marido sendo morto em frente à mulher ou uma filha sendo agredida em frente a uma mãe amarrada. A contraposição vai além também nas cenas em que a família de um grupo é o destaque. O comportamento dos policiais em família é tão idealizado que, em alguns momentos, temos a impressão de estar vendo aqueles comerciais de margarina. Por outro lado, o lar de um bandido é caótico, seja pelo linguajar, pelas atitudes ou mesmo pelas drogas.
Com tantos pontos negativos, qual seria então o segredo do sucesso de produções como essa? O mesmo “segredo” que explica o sucesso de programas policiais e a venda de jornais com manchetes “banhadas de sangue”. A violência faz com que a população busque refúgio em alguém, ou algo, que se comporte como o seu protetor ou guardião. E, nesse sentido, Rota Comando é uma ode ao trabalho dos policiais da ROTA. As cenas de ação, com perseguições e tiroteios pelas ruas da capital paulista, também fazem parte do nosso cotidiano. De certa forma nos vemos naquelas situações e, pelo contexto apresentado, torna-se plausível a idéia de que “poderia ser eu” numa situação como essa.
Não vou aqui entrar no mérito da forma de ação da ROTA. Numa frase marcante do filme o narrador informa que existem dois caminhos: o do bem e o do mal. Aqueles que escolherem o caminho mal, mais cedo ou mais tarde, trombarão com a ROTA em seu caminho. E, se trombarem, irão passear de camburão, sentados ou deitados. O pensamento é fartamente ilustrado ao longo das mais de 2h15 de produção e se, é correto ou não, é uma opinião particular que poderia gerar intermináveis debates.
O que se vê aqui é uma produção que tinha bons elementos, conteúdo e potencial para se tornar um interessante filme policial que retratasse, também, o cotidiano da corporação. Porém o resultado final, ao invés de um filme policial é um filme da polícia para a população. Que o trabalho da ROTA merece respeito não tenho dúvidas. Agora tornar a ROTA um reduto de cidadãos endeusados e dignos de toda a devoção é outra coisa completamente diferente.


Aqui tem o link direto para assistir o filme on line:

http://www.supertelafilmes.com/2009/08/rota-comando-o-filme-nacional.html

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